Waldez Ludwig fala sobre o mercado de trabalho





A agonia dos com crachá


Vivemos uma época curiosa. Paradoxal.

Nunca se falou tanto em dieta e nunca houve tantos acima do peso. Nunca produziu-se tanto alimento e nunca tanta gente morreu de fome. Nunca tanto dinheiro circulou pelo mundo e nunca ele foi tão concentrado nas mãos de tão poucos.

Tanta tecnologia farmaceutica e tantas doenças degenerativas e incuráveis. Tantas Faculdades e tanta ignorância diplomada. No meio de tantos paradoxos é possível encontrar mais um: O empregado de hoje anda muito doente!

Conheci recentemente uma empresa onde quem não sofria de indigestão crônica, tinha gastrite, refluxo ou câncer de estômago. Eram comuns os pedidos de licença para os exames de rotina para tratar do "bolo" no estômago e o pior de tudo é que eles pareciam não se dar conta que isso. Uma síndrome interna generalizada.

A turma do crachá vive um mal estar de quem precisa estar empregado, mas na grande maioria odeia o que faz e com quem convive. O que eu vejo e ouço parece filme de terror: a turma do crachá tem enorme dificuldade em admitir a profunda infelicidade em que vive nas suas baias tecnológicas, vendendo sua alma pelo salário e os benefícios do cargo.

Por outro lado, os sem crachá, do lado de fora, não vêem a hora de chegar a sua vez para vender suas alminhas...

Em que momento de nossas vidas entramos nessas armadilhas?

Com que talento nossa geração conseguiu legitimar o discurso da servidão voluntária!

É muito barato o processo de domesticação. Por qualquer plano de saúde ou previdência fica-se muito dócil.

No meio de tudo isso, há os feitores ...opsss, gestores. Num cenário de excesso de trabalhadores disponíveis, eles podem exercer seus pequenos poderes, despoticamente. Eles podem tudo, inclusive praticar assédio moral.

Assédio Moral, é uma espécie de doença degenerativa organizacional. Violência que não deixa marca, nem olho roxo, nem dá B.O. Sutil mas nada suave. Um bom exemplo é a elevação da carga de trabalho. Com as políticas de enxugamento de pessoal, downsizing e fusões, hoje é comum um funcionário fazer o que antes faziam três ou quatro, sem direito a reclamar, afinal, ele ainda é um dos privilegiados com crachá. Esse é o cenário instalado nas empresas. Num momento em que o discurso bonito é o de gestão das pessoas paradoxalmente nunca houve tanta sujeira em baixo do tapete nas organizações, de qualquer setor, porte e nacionalidade.
Assim ao invés de ser uma atividade de busca de significado, o trabalho assume sua definição medieval ou talvez romana, de “tripallium”, ferramenta de tortura e submissão. Deixar o trabalho ser apenas um instrumento de sobrevivência é empobrecer demais uma atividade que pode ser criativa, prazeirosa e rica de significados. Estreitar a visão de nossas possibilidades até o final do mês, ou até que o fim do salário chegue é patético demais. Prefiro acreditar e viver de acordo com a crença de estamos aqui para fazer algo mais do que apenas sobreviver.

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